DENÚNCIA: trans é presa depois de quebrar cadeira na Assistência Social de Piúma e teria sido humilhada pela Polícia, em Itapemirim

Laysse é natural de Itauna, Minas Gerais, chegou em Piúma vinda de São Mateus, segundo ela, depois de uma enchente. Ela diz que teve os direitos negados, pelo Cras e pela Polícia. A Reportagem apurou o fato.

A transexual, Laysse Carolini Silva Matias, 27 anos, residente no bairro Itaputanga, em Piúma, acabou presa na segunda-feira, 27, depois de desacatar servidores públicos, quebrar uma cadeira e chutar outras, na sede da Secretaria de Assistência Social, em Piúma.

Informações colhidas na Secretaria de Assistência dão conta de que Laysse já havia sido atendida no mês de dezembro com uma cesta básica, que ela reivindicou. Posteriormente ela voltou à Secretaria mais vezes para solicitar entrada no Benefício de prestação continuada – BPC, um benefício da assistência social no Brasil, prestado pelo INSS e previsto na Lei Orgânica da Assistência Social. Porém, no dia do fato, a trans teria se alterado e ameaçado os servidores, que se fecharam nas salas e acionaram a Polícia.

Ao jornal, Laysse contou que sofre de esquizofrenia e possui diversos laudos, ela teria tido um surto, quando quebrou o patrimônio público, sendo detida em seguida.

Por outro lado, a Assistência preferiu não falar sobre o assunto, uma vez que, a trans já teria passado por outros municípios do ES fazendo a mesma solicitação do BPC e provocando situações semelhantes. Há relatos por onde ela e o marido passaram.

BPC em vários municípios

Segundo Laysse, ela não tem condições de trabalho, por isso ela insiste no BPC, possui diversos laudos e faz uso de vários medicamentos controlados. Ela pede atendimento psiquiátrico e apoio na Assistência Social, uma vez que o marido também se encontra desempregado. “Eu queria fazer uma reportagem sobre um caso que eu sofri. Violência nos direitos humanos, pelo fato de eu ser negra, transexual, doente, com problemas mentais. Eu fui até o Cras, em Piúma, na Assistência Social, onde eu estava sendo assistida desde dezembro, quando me mudei para Piúma, para cadastrar meu auxílio, o acompanhamento pelo Cras, e para ter acesso aos meus direitos, como: remédios, por eu fazer uso de remédios contínuos, por receber o auxílio e estar sempre na luta do BPC Loas. Nisso eu ganhei uma cesta em dezembro, me prometeram uma segunda cesta em janeiro, fevereiro, até março”, contou.

Segundo a trans, marcaram o encaminhamento para o psiquiatra para dar início no BPC e fazer uma consulta onde deveria conseguir um laudo atualizado e depois, o marido foi pedir uma cesta. “O fato de eu estar sem alimentação, com benefício cortado, meu marido desempregado e tomando remédio fortíssimo como Quetiapina Risperidona, carbamazepina … Eu estava sem alimentação, com muita dor no estômago, em crise. Eu cheguei surtada pedindo uma cesta, pedi para chamar o prefeito, e chamaram alguém que resolvesse, em seguida me disseram que eu quebrei uma cadeira, e sai chutando o resto”.

A Assistência Social nega que no dia em que Laysse acabou sendo presa, ela tivesse chegado lá pedindo cesta, ela já teria chegado ao local ofendendo os servidores e bastante alterada.

Depois da cena, onde os servidores tiveram de se trancar para não serem agredidos, acionaram a Polícia.

A Assistência Social passou o caso à Defensoria Pública para que os direitos de Laysse sejam resguardados via justiça, e o que for para ela acessar, será concedido através de medidas judiciais.

A prisão

Tão logo a Assistência Social acionou à polícia, em Piúma, a trans foi levada à delegacia de Piúma, onde o delegado David Gomes Santanna lavrou o procedimento, encaminhando-a à Delegacia de Itapemirim, de onde ela deveria ser conduzida para o Presídio de Segurança Máxima em Viana, onde tem uma ala específica para pessoas LGBT’s.

Laysse disse ao jornal que passou fome na delegacia e teria sofrido maus tratos. Entretanto, na Delegacia de Piúma ela foi muito bem tratada, segundo o delegado David que abriu mão da marmita dele, com sua dieta, e ofereceu ao marido dela. Ela teria optado por comer frutas e ele também a ofereceu. 

“No dia dos fatos, ela foi levada à Itapemirim para o tele flagrante. Chegando lá, em razão do rompimento de um cabo, o sistema estava parado, a ordem superior pediu que eu lavrasse o procedimento aqui em Piúma, porque o tele flagrante estava fora do ar e não tinha previsão para voltar. Aqui, na delegacia, ela foi muito bem tratada, inclusive demos comida a ela, porque disse que estava com fome, dei de comer a ela e para o marido dela. Depois de lavrado o procedimento, Laysse foi encaminhada à Delegacia de Itapemirim, já que era da competência de lá fazerem o transporte. Eu somente lavrei o procedimento aqui para poder auxiliar no problema do rompimento do cabo. De lá como os CDP’s de Marataízes nem de Cachoeiro recebem pessoas trans, existe um CDP específico em Viana, foi enviada para lá”, explicou o delegado de Piúma

David foi enfático, disse que na Delegacia de Piúma, tanto Laysse como o marido comeram. “O marido dela pegou uma marmita minha, que eu separo de dieta para a semana, e dei para ele. Ela não quis a marmita, comeu frutas”.

Itapemirim

Laysse acionou o jornal e disse que sofreu maus tratos na Delegacia para onde fora conduzida, em Itapemirim. Ela disse que a puseram numa cela onde foi obrigada a dormir sem colchão, sem água e sem ter acesso aos medicamentos que faz uso, além de ficar sem comer nada. Disse que pela manhã havia uma cobra na cela e ela acabou tendo uma crise sendo levada ao pronto atendimento.

“A delegada de Itapemirim disse que eu tinha que me acostumar a ficar daquele jeito e dormir na cela, toda mijada, não tive direito nem a papel higiênico para limpar a bunda, fiquei sem tomar banho até ser transferida para Viana. Quando me liberaram de Viana, não passei por médico até hoje. Saí de Viana até chegar em Piúma, por conta própria. Passei na Rodoviária de Vitória pedindo dinheiro a todo mundo, ajoelhando nos pés de todo mundo, implorando para eu poder chegar em casa”.

Laysse disse estar traumatizada por ter ficado mais de meia hora algemada, embaixo do sol, com fome, sem água, sem remédio e os policiais não queriam colocar a mão nela. “Me deixaram cair no chão, dopada de remédio, chamaram as enfermeiras que tiveram de me carregar. Nem café da manhã na delegacia eu tive direito, no dia em que fui presa, nada. Quando eu estava passando muito mal, caída, para eu não morrer com a glicose caindo, eles me deram cinco bolachinhas e dois copos de água, no chão. Mandam eu pegar no chão”.

Transferência para Viana

 – “Na transferência para Viana, meu marido mais a advogada me pegaram no meio do caminho, eu tava dando parada respiratória, morrendo sufocada, eu estava algemada atrás, no cofre da viatura, sem ar, teve que trocar a viatura e mesmo assim eu fui morrendo no meio do caminho, quando estava chegando quase próximo de Viana eles me puseram para frente. Chegou no presídio, tirei a roupa para aquele tanto de policial. Tinha um policial que me ameaçou, falando que se eu desse crise e se eu chorasse dentro da penitenciária, ia me dar gás de pimenta, ia me bater, ia fazer e acontecer”.

No presídio

Segundo a trans, ela foi muito humilhada. “Eu cheguei, passei pelos procedimentos, me puseram pelada. E começaram a falar que iam tirar meu cabelo se ficasse presa. Me puseram numa cela com cinco ou seis pessoas. O guarda gritava: “É este povo que tem HIV, tem isso e aquilo outro. Eu tô com um corte no braço. Fiquei nesta cela com estes homens. Depois que viram a minha documentação me transferiram para outra cela do complexo da trans. Fiquei lá mijando numa vasilhinha de água sanitária”.

SEJUS nega maus-tratos

A reportagem solicitou à Secretaria Estadual de Justiça, explicações sobre as reclamações da transexual Laysse Carolynne. A Sejus enviou nota informando.

“A Secretaria da Justiça (Sejus) informa que a interna deu entrada no Centro de Triagem de Viana no dia 28 de fevereiro e, no mesmo dia, foi transferida para a Penitenciária de Segurança Média 2, unidade prisional exclusiva, e de referência à população LGBTI+, quando passou por audiência de custódia. 

A Sejus esclarece que todas as celas das unidades prisionais do Estado contam com sanitários e ressalta que realiza o registro dos presos no sistema pelo nome civil e com a informação do nome social indicado.

A Sejus informa que instituiu parâmetros e procedimentos para atendimento à população LGBTI+ em situação de privação ou restrição de liberdade nas Unidades Prisionais do Estado, conforme portaria Nº 413-R.

Dentre as instruções, o documento estabelece diretrizes quanto ao direito ao tratamento isonômico às pessoas presas LGBTI+; informações sobre identidade de gênero, sobre o direito de serem tratadas pelo nome social, bem como o direito à utilização de vestuário e corte de cabelo em acordo com a identidade de gênero”.

 Delegacia não responde

A reportagem enviou demanda à Delegacia de Itapemirim e solicitou ao delegado chefe informações sobre a prisão e transferência da trans. Até o fechamento da edição ele não havia respondido. Estamos aguardando a nota da Polícia Civil do Espírito Santo.

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