Artigo – Meu devedor entrou em recuperação judicial. E agora?

*Por Diego Nomiyama

A pandemia causada pelo novo coronavírus agravou o cenário econômico brasileiro, que já vinha tentando se recuperar da última recessão. Devido às medidas restritivas adotadas para o combate ao vírus, diversas empresas tiveram suas atividades restritas, aumentando o seu endividamento. Para evitar a falência, muitas recorrem ao Poder Judiciário, ajuizando pedidos de recuperação judicial, o que inevitavelmente causa um impacto em toda cadeia produtiva, incluindo os credores, os quais, por diversas vezes, ficam sem saber como serão pagos. É pensando nesse cenário que este texto tem como objetivo ajudar o leitor, credor de uma empresa em recuperação judicial, a ter alguma previsibilidade quanto ao recebimento daquele crédito.

Acredita-se que haverá um crescimento no número de pedidos de recuperação, tanto que a consultoria Alvarez & Marsal prevê, em 2021, um aumento de 53% no Brasil. Cenário que já se mostra real: nas primeiras semanas de abril de 2021, a mineradora Samarco entrou com pedido de recuperação judicial, enquanto que o Grupo Metodista se prepara para ajuizar o seu. Isso faz com que a recuperação judicial, considerada por muitos juristas e economistas como um processo caro, passe a se tornar mais presente no cotidiano do brasileiro.

Por exemplo, atualmente, a maior recuperação judicial da América Latina é a da empreiteira Odebrecht e a segunda é a da companhia de telefonia OI. Para aqueles que costumam ir a shoppings centers, os casos mais conhecidos são das livrarias Cultura e Saraiva e, para quem costuma viajar, as companhias de transporte Passaredo e Viação Itapemirim. Já para o leitor da região de Franca, tem-se o processo da Carmen Steffens, que possui o segundo maior faturamento do ramo de bolsas e calçados no Brasil.

 A recuperação judicial existe para se evitar a falência, isso significa que ela é um instrumento jurídico cuja finalidade é a preservação da atividade econômica no seu âmbito social, econômico e de mercado. Apesar disso, a recuperação judicial também provoca um efeito no caixa dos credores, pois ela impacta a forma como aquela devedora irá pagar suas dívidas.

Nesse sentido, imaginando que o leitor tenha um valor a receber da sociedade “A” em razão de uma duplicata mercantil que irá vencer em cinco dias, caso “A” entre com um pedido de recuperação antes do vencimento, ela fica momentaneamente impedida de efetuar esse pagamento, afetando o leitor que certamente esperava a entrada daquela quantia no caixa.

 Isso se dá porque uma vez instaurado o processo recuperacional, o pagamento só poderá ser feito por meio do plano de recuperação judicial, caso seja aprovado em votação, e quem vota são os credores.

Logo, é importante que o credor siga alguns passos iniciais para poder exercer esse poder de voto. O primeiro é verificar se o seu crédito é líquido, certo e exigível, como são os títulos de crédito, dentre eles os cheques não prescritos e as duplicatas. Em seguida, deve-se analisar qual o tipo de crédito que se tem a receber, em razão de nem todos se submeterem ao processo de recuperação judicial, como é o caso dos créditos fiscais e alienações fiduciárias.

Por fim, observa-se a data de “nascimento” desse crédito, e aqui não se confunde com a data do vencimento da dívida. Um crédito só se submete à recuperação judicial se na época em que foi ajuizado o pedido, a obrigação da devedora com o credor já existia. Então, imaginando uma duplicata mercantil emitida em 01 de janeiro de 2021, cujo vencimento está para 01 de março do mesmo ano, se nesse intervalo o devedor propuser o pedido de recuperação judicial, esse título de crédito se submeterá ao processo recuperacional, porque ele já existia quando houve o ajuizamento do pedido, mesmo que a obrigação não tenha vencido.

Constatado que o crédito se submete à recuperação judicial, o credor precisará consultar se o seu crédito está habilitado no processo. Para isso, deverá analisar a relação de credores e, caso não esteja,  pedir a sua habilitação. No primeiro momento, por prática jurídica, esse requerimento é feito para o administrador judicial e, se mesmo assim não houver a inscrição de seu crédito, há a via judicial por meio da impugnação de crédito.

Contudo, o credor deve estar atento ao valor que está habilitado ou pretende habilitar, bem como aos prazos estabelecidos na Lei nº 11.101/05. Já que seu poder de voto depende, muitas vezes, do valor indicado na relação de credores. 

Desse modo, caso algum devedor do leitor entre com o pedido de recuperação judicial, esses são os primeiros passos a serem seguidos para que haja a efetiva satisfação do crédito. Afinal, caberá aos credores, em conjunto, analisarem o plano de recuperação judicial e, se for o caso, aprovarem. Uma vez aprovado, os créditos passarão a ser pagos na forma estabelecida no plano.

*Diego Nomiyama é formado pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FDRP-USP), integra o escritório Dosso Toledo Advogados e atua na área de direito comercial, civil e societário.

Sobre o Dosso Toledo Advogados

O Dosso Toledo Advogados é um escritório de advocacia com sede em Ribeirão Preto, interior paulista, que atua em questões jurídicas empresariais de grande relevância, em todo o território nacional, desde 2014. Tem como sócios Ricardo César Dosso e Ana Cristina de Paiva Franco Toledo, profissionais com mais de 20 anos de atuação.

O escritório      conta, ainda, com mais de uma dezena de profissionais. A equipe oferece soluções em operações de fusões e aquisições; estruturação jurídica de empreendimentos; planejamento sucessório; recuperação judicial e falência; além de reestruturação do passivo de empresas. Os profissionais também atuam com questões jurídicas em direito societário; direito do agronegócio; direito trabalhista; e questões civis e comerciais em geral, incluindo contratos internacionais de importação e exportação de bens, direitos e serviços.

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