Professora da PUC, psicóloga e autora de Trilogia comenta exposição Contemplação

“A importância da Arte como auxílio na redução da dor”

 

Tereza Erthal – Psicóloga, Mestre em Psicologia Social, especializada em psicoterapia, professora e supervisora clinica na PUC, RJ , autora da Trilogia da Existência.

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A matéria de Luciana Máximo sobre a exposição intitulada “Contemplação”, chamou muito a minha atenção. A jornalista registrou em fotos as belezas do litoral sul do Espírito Santo, criando uma bela exposição em um hospital. A relação entre a arte e a dor pode parecer estranha, num primeiro momento, mas se a arte é o campo de fruição do belo, seria possível que houvesse algum tipo de interferência com a percepção subjetiva da dor? Seria viável que através da arte houvesse a possibilidade de desviar o olhar daquilo que lhe rouba a tranquilidade, para repousar o olhar em momentos plácidos?

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Comecemos com alguns exemplos concretos: “Doutores da Alegria” é uma organização que utiliza a arte do palhaço para intervir junto a crianças e adolescentes, em situação de vulnerabilidade e risco social, em hospitais públicos e ambientes adversos. O objetivo deste grupo é entreter as crianças para minimizar a sua dor e solidão que muitas doenças provocam. Os resultados são bastante conhecidos e corroboram com a tese de que existe uma forte relação entre dor e arte. Outro exemplo comprovado é a Arte Terapia: método de tratamento para o desenvolvimento pessoal, interagindo no contexto psicoterápico mediadores artísticos. Origina uma relação terapêutica particular entre sujeito (criador), objeto de arte (criação) e o terapeuta (receptor), cujo objetivo é trazer à tona situações inconclusas para serem apreciadas e concluídas no ambiente terapêutico.

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Os gênios da arte estariam surpresos ao saber que suas famosas obras de arte foram usadas em prol da ciência! Quadros de artistas foram usados em um estudo italiano que mostrou que a contemplação de belas obras de arte é capaz de diminuir a sensação subjetiva da dor, isto é, a percepção do estímulo doloroso. Segundo os pesquisadores (Michele Sardoro, Paolo Livrea e Marissa de Tommaso), a percepção da dor é modulada por vários fatores sensoriais, afetivos e emocionais. Parece existir uma relação entre a percepção da dor, ou forma como é sentida, e a apreciação estética de obras de arte.

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Apesar de subjetivas, as percepções de beleza e feiura influenciam as funções cerebrais.

O experimento, apresentado na revista “Consciouness and Cognition”, constou de doze voluntários, leigos em arte, que teriam que apreciar 300 quadros cuidadosamente escolhidos. A tarefa era classificar tais obras em três categorias: belas, feias e neutras. Todos tiveram suas ondas cerebrais monitoradas durante o experimento. O resultado indicou que a percepção da dor apresentava uma variação de acordo com a apreciação estética. Houve uma redução significativa da dor no caso da apreciação do belo. A hipótese parece ter se confirmado: as experiências sensório-emocionais são capazes de influenciar a percepção da dor.

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Os autores defendem a ideia de que, se obras belas pudessem povoar os hospitais, não apenas embelezariam o ambiente, como também promoveriam algum tipo de alento aos pacientes. Foi o que Luciana Máximo parece ter entendido. A exposição no hospital poderia trazer muitos benefícios importantes.

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Sabemos que onde está o foco do nosso pensamento é onde está a nossa criação. Criamos o nosso mundo com nossos pensamentos. Se fixarmos o olhar no que é triste e feio, agregamos ao nosso mundo uma espécie de feiura que traz sensações bem desagradáveis. Somos criadores da nossa própria realidade. Na verdade, somos a nossa própria obra de arte! Apreciando o belo e amoroso, vamos tecendo fios de alegria num mundo que se torna menos hostil. Luciana Máximo deseja estimular este olhar, fazendo, através de suas belas fotos, com que a natureza emprestasse seu ombro amigo aos mais desamparados momentaneamente pela vida. A dor distorce toda a nossa percepção, se apenas ela for o autor principal da peça.

Fico imaginando o paciente triste, em desalento, esperando para ser atendido, de repente pousar seu olhar numa destas obras. É como se uma esperança surgisse e viesse com uma legenda: o mundo não é tão feio, ou, existem coisas maravilhosas para serem vistas. A dor pode ser transcendida e a arte é uma das formas de se atingir este objetivo. E como alguns autores já falaram inúmeras vezes, existe três formas de fugir do sofrimento: pelo suicídio, pela loucura ou pela arte. Por esta, a sanidade pode ser restaurada, assim como a dor pode ser superada apenas pelo desvio do olhar. Quando retiramos a luz da nossa consciência de algo, retiramos-lhe toda a sua força. Na famosa frase, “o que não se usa, se atrofia”, corrobora bem esta questão.

Portanto, o que me parece lógico é aproveitar estes estudos para compor um quadro melhor de uma realidade bem difícil de suportar. Que todos os hospitais tenham a mesma iniciativa e tragam a beleza como forma adequada de compor a realidade do momento. Parabéns, Luciana, pela grande iniciativa! Seja bem vinda ao mundo mágico da cocriação!

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