Da mata para os palcos

Zee & Ricardo uma dupla de personalidade – eles bateram um longo papo com a Reportagem, na Casa Rosa Violeta e contaram detalhes da dupla. Zee é índia, nasceu na mata e começou a cantar com o pai aos seis anos na Rádio

 

Filha de pai, avó e avô índios, da tribo dos botocudos, de Minas Gerais, mãe russa, Zee Leila conta um pouco da sua paixão pela música e pela arte. A mãe foi roubada pelo pai. Os avós maternos deixaram a Rússia e vieram para o Brasil, a avó ainda estava grávida dela que nasceu neste país. Quando a avó virou moça, eles viviam no meio de uma mata. O avô era índio de uma tribo e a avó de outra, as duas tribos não se davam bem, o avô foi lá e a roubou e foram morar em outra cidade, no meio do mato. “Eu nasci na mata, em Barra de São Francisco, num lugar chamado Monte Sinai. Não havia sofrimento. Quando a gente mora na roça, muitas pessoas levam para o lado pobre, eu levei para o lado rico da coisa, me sentia rica na roça, lá não faltava nada. Não faltavam frutas, brincadeiras, não faltavam crianças para brincar com a gente, não faltavam adultos para educar, comida, a gente produzia, eu virava barro para plantar arroz. Fazíamos esteiras com cambitos, pegava taboa, achava muito bom. E a gente fazia bolsa de taboa bordada, minha história com a arte começa aí”.

Zee começou a cantar aos seis anos na rádio local com o pai que era sanfoneiro, violeiro e tocava vários instrumentos.

Sensível e de personalidade forte, Zee não se deixa contaminar com modismos no palco, construiu o seu próprio estilo. A música sempre esteve presente em sua vida, desde os programas de Rádio AM, quando ouvia Amilton Lelo, Trio Parada Dura, Chitãozinho e Xororó. Música é tempo, dedicação, fases. “Na época, apesar da gente morar no meio do mato, ouvia muito bons nomes da música popular, Amilton Lelo é um deles, hoje quase ninguém sabe quem é, eu ouvia Trio Parada Dura, Chitãozinho e Xororó, nas Rádios AM, ouvi muito o programa Zebetio e Osvaldo Betio”.

Tinha um programa também chamado “Saudade não tem idade” que Zee assistia no antigo rádio, aqueles semelhantes a uma caixa de abelha, enorme, de madeira, com um botão grande usado para sintonizar na estação. “Assistíamos as novelas no rádio, ficávamos todos sentados em frente olhando para o rádio, imaginando as personagens, aquela novela que tinha o Zé das Medalhas, eu assisti no rádio. Eu começo a gostar dos estilos ouvindo rádio…”

Mesmo ouvindo músicas caipiras e sertanejo de raiz, Zee não inclui no seu repertório atual.  “Eu cantei muito sertanejo raiz com meu pai. Na época as pessoas faziam lojas e lá tinha a Casa dos Retalhos, saímos de onde morávamos e íamos para Barra de São Francisco, e o pai cantava lá. Um dia meu pai me levou para se apresentar com ele e eu cantei, fazendo a segunda voz para ele. Meu pai era muito enjoado, se desafinasse chegava em casa e levava bronca”, relembrou.

Zee tem músicas próprias, mas ainda não gravou CD, é interprete de grandes nomes, confessa que ama Sérgio Sampaio e no repertório canta várias canções.

Na igreja

Cresceu na Igreja Batista tradicional, quando jovem frequentou a Batista do Calvário, onde ela e os irmãos tocavam e cantavam. Depois de adulta deixou de cantar na igreja e assumiu a noite e eventos, mas sempre inclui uma canção gospel no repertório, ama ouvir louvores e tem gravados alguns. “Começamos a participar lá na Batista do Calvário, meu irmão tocava baixo e as vezes guitarra, a minha irmã tocava violão e cantava. Todos os irmãos são músicos, os que não cantam em coral de igreja, cantam em barzinhos, aniversários, festas. Comecei a cantar na igreja batista do Calvário e gostei muito, o louvor liberta a gente, você começa a ouvir o louvor parece que a sua alma abre. Pode não ser Deus falando com a pessoa, mas é a própria pessoa falando com ela, é a própria alma falando para o corpo, ‘eu cuido de ti”, é a minha preferida”.

Estilo diferente

Na maioria das casas que contratam músicos as músicas mais solicitadas são as que estão na mídia e os cantores de um modo geral acabam por cantar e tocar o que o público quer ouvir. A dupla Zee & Ricardo tem estilo próprio e muitas das vezes, deixa de tocar para não servir a exigência da casa, por isso não se acha concorrente no mercado da noite. “Nós temos o público e as casas, não falta espaço para ninguém”.

Desvalorização da música da MPB

Tanto Zee como Ricardo Vianna não veem com bons olhos os fenômenos musicais do momento, Anita, Pablo Vittar, Ludmila e Juju, por exemplo. “Eu acredito que tenha alguém muito grande que está por trás disso tudo. Eu não acredito que o público esteja dando valor a isso, deve ter alguém por trás desses novos ídolos populares que está bancando gravações e apresentações nos programas de TV e rádio. Eu vou entrar numa questão meio polêmica que é a nova ordem mundial, a destruição da família, da sociedade, dos valores, dos conceitos e da cultura. O que acontece, quando criado o caos, surge um salvador e todo mundo fica à mercê deste salvador. Para mim, esse conceito de nova ordem mundial não é apenas no Brasil, isso tem células na França, na Alemanha, células na Espanha, eu digo mais, grandes empresas como o Banco Santander, por exemplo bancam”, frisou Ricardo.

Pablo Vittar, Anita, Ludmila e Juju, do Que tiro foi esse, são exemplos que muitos cantam Brasil afora e parece que são os melhores do mundo, com milhares de visualizações e curtidas nas redes sociais. Por mais que milhares de pessoas consumam o modismo, o público seleto, segundo a dupla sempre terá o seu espaço garantido. ‘Nós temos ouvido muito na noite de colegas músicos que nos falam: vocês têm de tocar isso, aquilo, senão você não fica na casa, eles não voltam a te contratar’. As casas que a gente toca, continuamos tocando, nós não nos prostituímos, metaforicamente a esses estilos solicitados. Eu não me vendo, se falarem você é obrigada a cantar Pablo Vittar na minha casa, eu falo tchau. Eu fui tocar em um bar em Piúma que eu saí arrasada, o público estava aquém do meu repertório. Se me chamasse de novo eu não voltava, e não voltamos. A proposta do dono do bar era justamente levar a boa música para aquela comunidade, mas a comunidade não aceitou e a casa fechou, uma pena”.

Repertório

A dupla Zee e & Ricardo tem um estilo próprio, sempre que se apresentam tocam Nando Reis, Sérgio Sampaio, Raul Sampaio, Cassia Ellen, Roupa Nova, Ney Mato Grosso, Belchior, Elis Regina, Queen, With His Song…

Surgimento da dupla Zee & Ricardo

A dupla surgiu de fato quando vieram residir em Piúma há uns 10 anos, antes se conheceram na banda Astemis, Ricardo tinha vindo de uma banda de rock in roll, a Sex Vírus (vírus do Sexo), onde Zee acabou o conhecendo. “Quando eu estava retornando na Banda Astemis, ela estava cantando e a gente se conheceu. Apaixonamo-nos à primeira vista’, confessou Ricardo. “Eu me apaixonei pelo olhar dele, tinha três meses que eu estava separada do meu ex-marido, aí a banda estava precisando de uma nova vocalista”, disse Zee. Ricardo de início a dispensou, disse que a Banda já tinha 10 componentes e não havia necessidade de contrata-la. Mas, ele acabou mudando de ideia quando a viu cantar a primeira música. Lá eles começaram a trabalhar arranjos juntos, ajustes, enfim, juntaram um com o outro e fundiu na dupla.

Zee & Ricardo agradeceram as casas que são parceiras da arte e aproveitou o ensejo para destacar o Bar do Jonas, que fazia questão de ter um palco para receber o artista. “Lá o artista sempre foi tratado como artista. Jonas jamais desrespeitou os músicos e sempre valorizou todos os estilos. Nós agradecemos a todos que nos contratam, todos que gostam da dupla Zee & Ricardo, sem exceção, amamos Piúma, o Espírito Santo, cada dia é dia de aprendermos mais para melhor fazer para o nosso público”.

Quem ver Zee & Ricardo no placo, não imagina a história de ambos. Ela se casou aos 15 anos, tem sete irmãos, teve oito filhos, vivos quatro, três morreram ainda no útero e um nasceu e faleceu no mesmo dia.

Zee costura peças únicas, confecciona roupas para bandas e festas a fantasia, ama artesanato, produz diversas peças, e com as ervas aprendeu a fazer um pouco de tudo, remédios, chás, sucos, sabonetes e outros. Quando não está cantando está totalmente envolvida com a arte de um modo geral.

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